O Pátio do Colégio, região Central, marco do nascimento da Capital que mantém, apesar dos problemas, o seu charme de ponto inicial da metrópole paulistana. Uma mistura de estilos arquitetônicos de vários séculos que permite entender as diferentes etapas da história de São Paulo, o Pátio abriga também prédios que sintetizam a vida social da cidade desde a chegada dos jesuítas.
A igreja e o Colégio representam o poder da Igreja Católica. Os prédios em estilo neoclássico da Secretaria da Justiça e do Primeiro Tribunal de Alçada Civil são a representação do Estado, enquanto a Rua Boa Vista, centro bancário, simboliza o poder econômico. A casa da Marquesa de Santos, na Rua Roberto Simonsen, por sua vez, relembra a antiga aristocracia, elite dominante do período colonial. Estão lá, reunidos num único espaço, todos os elementos constituintes da sociedade paulistana.
Apesar do mau estado de conservação de alguns monumentos, entre eles o Monumento à Fundação da Capital, construído em 1925, o Pátio ainda apresenta, apesar das mudanças, a estratégica colina próxima ao Rio Tamanduateí, que ocupava a região onde hoje é o Parque Dom Pedro II. O rio servia para o transporte de religiosos, tropas e mantimentos. A colina era usada como ponto de observação de índios hostis e outros inimigos da povoação, batizada de São Paulo de Piratininga.
Em 25 de janeiro de 1554, o padre Manuel de Paiva presidiu a celebração da primeira missa na frágil palhoça do Pátio. Os padres José de Anchieta e Diogo Jácome o auxiliaram. O padre Manuel da Nóbrega era o responsável pelos jesuítas no planalto de Piratininga. A data celebrava o dia da conversão do apóstolo São Paulo ao cristianismo.
Depois da expulsão dos jesuítas do País pelo Marquês de Pombal em 1759, o governador Morgado de Mateus requisitou o espaço, em 1765, para ser o Palácio dos Governadores. O Pátio tornou-se então, sede do Governo da Província e abrigou outros orgãos públicos. A igreja antiga foi demolida em 1896, e foi reconstruída em 1979. Na década de 50, o Pátio do Colégio voltou ao domínio dos jesuítas, como um dos primeiros atos de celebração do Quarto Centenário.
Sacerdote lembra de disputas
Fundador do Museu Anchieta, no Pátio do Colégio, e um dos maiores especialistas na história do padre-poeta José de Anchieta, o padre jesuíta Hélio Abranches Viotti, de 90 anos, é um paulistano típico. Dono de uma excelente memória, o sacerdote nasceu onde hoje é o Prédio da Eletropaulo, na Rua Xavier de Toledo, e seu avô materno Frederico Abranches, foi um político renomado e um dos fundadores do Teatro Municipal, na Praça Ramos de Azevedo, símbolo da vida cultural paulistana.
Gesticulando muito, como todo descendente de italianos, o padre Viotti relembra as discussões travadas com a comunidade portuguesa e o padre Serafim Leite, sobre o papel do Padre Anchieta na fundação de São Paulo. “Havia um grupo que queria excluir Anchieta, natural das Ilhas Canárias, de posse espanhola, da história e deixar somente o padre português Manuel da Nóbrega com essa honra. Entendo a importância de Nóbrega, mas os documentos antigos dizem que foi Anchieta o principal fundador”.
Segundo o sacerdote, Nóbrega queria fundar o Colégio de São Paulo em outra região mais próxima do Paraguai, onde viviam os indios carijós (guaranis). O planalto de Piratininga era habitado pelos bravos tupis e tamoios. “Com sua personalidade forte e carisma, Anchieta conseguiu manter o colégio aqui. A história seria muito diferente se o colégio não permanecesse nessas terras”, defende.
Na opinião do padre, o Pátio do Colégio, onde morou por oito anos, foi fundamental para o desenvolvimento da cidade, porque se tornou um centro de atração e fixação demográfica para os indígenas e europeus que iniciaram a colonização da Capital.
Anchieta é pioneiro da Literatura Brasileira
Muito inteligente e habilidoso no trato com os indígenas, o padre José de Anchieta nasceu em São Cristóvão de Laguna, Ilha de Tenerife, Canárias, em 19 de março de 1534. Enviado pelo pai à Universidade de Coimbra, entrou em 1551 na Companhia de Jesus. Em 1553, Anchieta chegou à Bahia, dirigindo-se depois a São Vicente e ao planalto do Piratininga, onde fundou o colégio que viria a ser o berço da Capital. Durante as celebrações do quarto centenário de sua morte, que aconteceu em 09 de junho de 1597, uma comissão de representantes das Ilhas Canárias veio ao Brasil trazendo uma imagem de Nossa Senhora da Candelária, a padroeira da ilha.
Anchieta é considerado o iniciador da literatura brasileira por causa de suas poesias, a mais conhecida delas, o 'Poema da Virgem', foi escrito em latim, língua que passaria a vida ensinando a portugueses e índios na areia da praia em homenagem a Nossa Senhora. Na ocasião, o sacerdote era refém dos índios tamoios, que formaram uma confederação para atacar a Vila de São Paulo de Piratininga. Anchieta e Nóbrega negociaram o Armistício de Iperoig (hoje Ubatuba) conseguindo afastar a ameaça.
Outro grande perigo para a então incipiente vila de São Paulo, o ataque dos mamelucos (filhos de índios com portugueses) e tribos selvagens da povoação de São José da Borda do Campo (atual Santo André) foram enfrentadas por Anchieta e Nóbrega. Estrategista, Nóbrega deu ao cacique Tibiriçá e ao chefe Caiubi a missão, que deu ótimos resultados, de defender a vila. Os indios veneravam a Anchieta e o chamavam de Paye-Guassu (Grande Pajé) enquanto os portugueses o tratavam como apóstolo ou santo.
Moacir Assunção, Diario Popular, 25/01/1997
Museu Anchieta - Pateo do Collegio
NOTA: De acordo com o Colégio Brasileiro de Genealogia, o padre Hélio Abranches Viotti, Capelão da Força Expedicionária Brasileira durante a Segunda Guerra Mundial, ex-diretor do Arquivo da Cúria Metropolitana de São Paulo e membro da Academia Paulista de Letras, faleceu em Belo Horizonte (MG) a 28 de novembro de 2000, aos 94 anos.
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